sexta-feira, 15 de abril de 2011

Quer levar Jesus pra casa hoje?

 Quem quer levar Jesus pra casa hoje? Levante a mão e faça um sinal de aceitação...

 Essa Fraseologia já virou um mantra nas igrejas evangélicas. É o chamado apelo. A hora da decisão, onde a danação ou a salvação eternas estão em jogo. No momento em que o pastor pede para o pecador levantar a mão em sinal de aceitação à Cristo, cabe aos salvos ficarem ¨em espírito de oração¨(sic), pois pode ser que um demônio teimoso, esteja agarrado em seus braços fazendo-o pesar.

 Eu sempre tive dificuldades em aceitar essa prática cristã chamada de apelo. Primeiramente, por que o apelo é uma cópia evangélica pentecostal que remontam à época de Chales G. Finney (1792-1875). Ricardo Gondim, elucida o protótipo do apelo nas seguintes palavras: ¨Depois que terminava de pregar, Finney conduzia as pessoas que se sentavam no  banco dos ansiosos para mais instruções, conduzindo-as assim à salvação. Finney foi copiado ferozmente por evangélicos pentecostais ao redor da terra e seu banco dos ansiosos tornou-se o precursor do apelo¨( Gondim 2010).

 Em segundo lugar, não existe nada mais constrangedor que - praticamente - obrigarem as pessoas a aceitar a Cristo. O próprio Jesus, penso eu, jamais aceitaria algo forçado. Esse apelo é literalmente um apelo emocional e constragedor. As pessoas agindo assim, tornam-se cristãs compulsoriamente e muitas vezes nem sequer tem consciência disso.

 Um outro problema com essa mentalidade, é que ela transforma o evangelho e a pessoa de Jesus em outra coisa; lhe dão um outro sentido. Vejamos pois:

O evangelho segundo minha igreja

Os cristãos da primeira geração quando ouviam pronunciar a palavra grega ¨evangelion¨ sentiam ecoar na alma ideias e sentimentos que, hoje, nós não mais percebemos devido à mudança de mentalidade. Tal palavra evocava sentimentos de alegria e festiva sensação, pois indicava o anúncio do nascimento de um novo mundo: nos corações, em suas existências e em sua comunidade.

Se nas cidades gregas a palavra ¨evangelho¨ tinha o sentido de anúncio do nascimento de um salvador terreno (um imperador, ou uma pressuposta divindade), nas comunidades judaicas ou cristãs da Palestina significava o advento do reino messiânico, do reino de Deus entre os homens. ¨Evangelho¨= ¨Boa nova¨ para eles não é um livro ou uma instituição, mas a chegada do Messias vivo no meio deles, é uma presença de salvação, é uma existência de Deus já contemporânea ao homem.

Hoje o evangelho é entendido e confundido com a mensagem particular da igreja, ou se preferirem, ¨marketing¨ religioso. A definição de marketing é a seguinte: ¨Conjunto de medidas que provêem estrategicamente o lançamento e a sustentação de um produto ou serviço no mercado consumidor, garantindo o bom êxito comercial de iniciativa¨( Dicionário Aurélio). A igreja atual se tornou num banco de serviços onde os fiéis são vistos como clientes. Eu chamo essa nova mentalidade de religião à la carte onde os milagres são self service. A socióloga Júlia Miranda utilizando-se do termo: religião à la carte, diz o seguinte:

O comportamento (dessa religião) é tipicamente consumista. Guarda-se da herança tradicional apenas o que interessa e convém; mantem-se uma fé que não exige alto grau de coerência entre os papéis. A integração pessoal é alcançada por meio do direcionamento das energias e do desmpenho em todos os setores da vida, para objetivos individualmente formulados, tais como bem-estar e sucesso. (Horizontes de bruma: os limites questionados do religioso e do político. pág 49)

A maldição do Cristo genérico

O teólogo Eugene H. Peterson escreveu um livro cujo o título é ¨A maldição do Cristo genérico¨. Na introdução, Peterson afirma: ¨Teologia espiritual é a atenção que damos aos detalhes de viver trilhando esse  caminho (caminho que Cristo revelou). É um protesto contra  a teologia despersonalizada, transformando-a num conjunto de informações sobre Deus; é um protesto contra uma teologia funcionalizada, transformando-a num planejamento estratégico para Deus. ¨

O Cristo que é pregado por igrejas com viés ¨marketeiro¨ é um Jesus Panacéia; um remédio genérico que serve pra tudo. É mais ou menos assim: passa Jesus que passa. Cristo, visto desta forma, não é mais um ser, mas um produto ou uma marca. Não é o Jesus histórico (querigma) que é anunciado, mas um produto industrializado. As frases eclesiais não me deixam mentir:

¨Leve Jesus pra casa hoje¨
¨experimente Jesus, você vai gostar¨
¨Jesus é bom¨
¨quem vai querer Jesus?¨
¨você aceita Jesus?
¨Dê uma chance pra Jesus¨

Não precisa ser muito reflexivo pra preceber que Jesus é leiloado em todo culto religioso. Esse apelo sentimental chega a ser ridículo. Mesmo inconsciênte, a mentalidade religiosa foi consideravelmente influenciada pela Revolução Industrial, pela globalização, pela pós-modernidade... Não duvido nada se os pastores além de oferecerem o produto, dar-nos ainda 3 anos de garantia aos consumiodores de Jesus.

Qual a proposta então?

Acabar com os apelos. Jesus não é produto de fim de feira. Aconselho as igrejas que releiam a Bíblia sem os óculos agostinianos ou calvinistas; fugir da hermenêutica particular e deixar que a mensagem flua naturalmente. Deveriam seguir o exemplo da parábola do filho pródigo ( Lucas 15). Nesta parábola está o retrato prefeito da liberdade que se tem em seguir o Cristo (ou não). As porta da casa do pai estavam abertas pra deixar o filho partir (sem constrangimento), e abertas pra quando o filho retornar, caso queira (sem constrangimento). Ser livre, para Deus, é ser realmente livre pra dizer ¨sim¨ ou ¨não¨; é ser livre pra aceita-lo ou rejeita-lo sem constragimento.
 Faço das palavras do teólogo alemão Paul Tillich as minhas:

A pergunta implícita agora é: de que maneira a mensagem cristã pode ser comunicada para as pessoas de nossa época? Em outras palavras, estamos indagando de que maneira o evangelho pode ser transmitido. Como tornamos a mensagem vista e ouvida e, consequentemente, aceita ou rejeitada? A comunicação do evangelho significa expô-lo diante das pessoas para que decidam por ele ou contra ele. O evangelho cristão é matéria de decisão. Tem de ser aceito ou rejeitado.

Parafraseando: o evangelho não é algo a ser imposto; é simplesmente anunciado. Todo ouvinte tem autoridade de aceitar ou recusar sem constrangimento pois o próprio Deus lhe deu essa liberdade.

É preciso substituir o Jesus produto pela percepção de Jesus como pessoa e, como pessoa, pode relacionar-se. ¨Através da apresentação do Jesus histórico e do mais histórico de Jesus, a cristologia latino-americana busca o acesso pessoal a Jesus. Isso é feito não apresentando, em primeiro lugar, conhecimentos sobre ele para que o homem decida o que fazer e como relacionar-se com esse Jesus assim conhecido, mas apresentando sua prática para recriá-la e assim aceder a Jesus.¨ (Jose V. Peinado). A igreja não é um banco de serviço religioso, mas um lugar de comunhão e crescimento humanitário coletivo.

Entender que fé não é ¨varinha de condão¨ e Deus não é o gênio da lâmpada qua vai nos conceder todos os desjos do nosso coração independente de quais forem. Seguir a Cristo não é ter garantia absoluta de nada.

E aí! Vai querer levar Jesus pra casa hoje? 

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