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Mostrando postagens de agosto, 2024

INSTAGRAM THERAPY

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  INSTAGRAM THERAPY Quando o The New York Times definiu, em um artigo de 2019, que “Instagram Therapist Are the New Instagram Poets”, levantou-se uma questão importante: Ok, uma simples postagem pode trazer bons insights psicológicos, mas será que também não pode servir como um substituto bastante precário para uma boa sessão de terapia? A revista Psychology Today listou alguns pontos de cuidado para essa tendência que tomou conta não só de perfis de profissionais de saúde mental, mas também de influenciadores e  marcas que adoram a estratégia editorial de psicologizar a sua base de seguidores. Segundo o artigo, os principais riscos identificados neste tipo de conteúdo são: 1) Superficialidade; 2) Generalização e; 3) um caminho alienante de mão única. Ou seja, é um conteúdo supostamente terapêutico que pode, inclusive, gerar gatilhos em alguém que não está preparado para enfrentá-lo sem um acompanhamento adequado. Além de tudo, a “terapia de graça no feed” costuma fazer  com que a gent

SERÁ ISTO VERDADE OU MERA FANTASIA VÃ?

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  "SERÁ ISTO VERDADE OU MERA FANTASIA VÃ?" Eurípides, Ion (410 a.C.) Gostaria muito de crer que, ao morrer, voltarei a vida. Que parte de mim há de prosseguir: pensando, sentindo, lembrando. Mas, por mais que queira crer, e apesar das velhas tradições que nos garantem que existe um além... não conheço nada que sugira que isto seja mais que ilusão ou desejo. Quero envelhecer junto com minha esposa, Annie, a quem amo muito. Quero ver meus filhos mais novos crescerem e quero participar do desenvolvimento de seu caráter e intelecto. Quero conhecer os netos ainda não concebidos.  Há problemas científicos cujas soluções desejo testemunhar - como a exploração de muitos dos mundos em nosso sistema solar e a busca de vida em outros lugares. Quero ver como vão se desenvolver tendências importantes na história humana, tanto promissoras como preocupantes: por exemplo, os perigos e a promessa de nossa tecnologia; a emancipação das mulheres; a crescente predominância política, econômica e

LARANJA MECÂNICA E A GENIALIDADE DE STANLEY KUBRICK

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 LARANJA MECÂNICA E A GENIALIDADE DE STANLEY KUBRICK* Quando o assunto é violência, particularmente a delinquência juvenil, o clássico Laranja Mecânica (A Clockwork Orange) lançado em 1971 e dirigido por Stanley Kubrick (1928-1999), nos vem à mente.  Baseado no livro homônimo de Anthony Burgess a história mostra o protagonista, Alex, narrando sua própria vida, começando pelos atos bárbaros que cometia com sua gangue sem outro propósito que não a violência em si. Ele acaba preso e condenado à prisão por quatorze anos. É uma época de grandes avanços, no entanto, surge a promessa de um tratamento revolucionário, que superará em definitivo as “teorias penológicas”, como diz o ministro do Interior, defensor de que os presos sejam tratados “de uma forma puramente curativa”. Em quinze dias, Alex está solto, após passar por sessões de condicionamento aversivo tão intenso que desenvolve náuseas insuportáveis diante de atos violentos. Aos protestos do capelão do presídio, que brada contra a perd

CRETINOS DIGITAIS

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A LITERATURA EMPÍRICA DE DESMURGET É O MOTIVO PELO QUAL REDUZI DRASTICAMENTE MINHA VIDA ON-LINE; TAMBÉM É O MOTIVO PELO QUAL MINHA FILHA DE 12 ANOS AINDA NÃO TEM CELULAR. O livro A fábrica de cretinos digitais: Os perigos das telas para nossas criança s, escrito por Michel Desmurget e publicado no Brasil em 2021, convida o leitor a uma ampla reflexão sobe os impactos do uso das telas digitais no desenvolvimento infantil. Desmurget escreve a obra num momento em que as atuais gerações dedicam um grande tempo de suas vidas para interagir com smartphones, tablets, computadores, redes sociais e televisão. É um livro que instiga a pensarmos sobre a saúde física, mental e intelectual de crianças, jovens e adultos e nos provoca a aprendermos a conviver e nos relacionarmos de uma maneira saudável com as telas. Existe vida real fora de Facebook, Instagram e demais redes. Jamais vou trocar horas de leitura prazerosa, de ouvir música ou de estar na companhia de pessoas que significam muito para mi

CRISTOFASCISMO

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“Somos cristãos como os judeus” Acredito que não seja necessário contextualizar a frase epígrafe deste texto. Confio  na capacidade cognitiva de quem lê para fazer a correlação necessária. O termo cristofascismo não é um neologismo atual como muitos podem pensar. Para ser mais exato, remonta a 1970 tendo sido cunhado pela teóloga alemã Dorothee Sölle; basicamente é a combinação (paradoxal) entre cristianismo e fascismo.  Se remontarmos à época de Lutero, o grande reformador, e lermos o que ele disse acerca dos judeus, talvez esclareça um pouco a relação absurda da frase “Somos cristãos como os judeus”. Martinho Lutero era um extremado anti-semita. Lutero chamava os judeus de “venenosos”, “vermes repugnantes” e “gentalha repugnante”. Em 1543, próximo à morte, escreveu três panfletos contra os judeus. Reproduzo um trecho a seguir: Em primeiro lugar, incendeiem suas sinagogas ou escolas, enterrem e cubram com lama tudo o que não pegar fogo, de forma que nenhum homem jamais volte a ver uma

AMOR NÃO É META, NEM MERITOCRACIA

 O apaixonamento pode ter mesmo virado uma espécie de produto, um objeto de consumo do nosso tempo, a respeito do qual podemos dizer: "Eu quero ter isso, vou comprar" ou "Não, obrigado! Não vou querer comprar" — como se pudéssemos decidir se vamos nos apaixonar ou não, ou escolher por quem e com qual intensidade. Mas isso é muito autoritário com a nossa libido.  Escreve Ana Suy: "A gente não ama alguém porque quer e não é amado porque merece. Amor não é meta e nem meritocracia".

CONTRA OS QUE TÊM RESPOSTA PARA TUDO

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Uma das lições que a era hitlerista nos ensinou é a de como é estúpido ser inteligente.  Quantos não foram os argumentos bem fundamentados com que os judeus negaram as chances de Hitler chegar ao poder, quando sua ascensão já estava clara como o dia! Tenho na lembrança uma conversa com um economista em que ele provava, com base nos interesses dos cervejeiros bávaros, a impossibilidade da uniformização da Alemanha. Depois, os inteligentes disserem que o fascismo era impossível no Ocidente. Os inteligentes sempre facilitaram as coisas para os bárbaros, porque são tão estúpidos. São os juízos bem informados e perspicazes, os prognósticos baseados na estatística e na experiência, as declarações começando com as palavras: "Afinal de contas, disso eu entendo", são os statements conclusivos e sólidos que são falsos. Hitler era contra o espírito e anti-humano. Mas há um espírito que é também anti-humano: sua marca é a superioridade bem informada.

FICAR COM O PROBLEMA - fazer parentes no Chthuluceno

 Trouble é uma palavra interessante. Ela deriva de um verbo francês do século XIII que significa agitar, instigar, enturvar, perturbar. Nós - todos os seres da Terra - vivemos em tempos perturbadores; tempos confusos, turvos e desconcertantes. Nossa tarefa consiste em nos tornarmos capazes de responder, conjuntamente e em todo nossa abundância espevitada de tipos. Nossos tempos confusos transbordam de dor e alegria - com padrões vastamente injustos de dor e alegria, com matanças desnecessárias da continuidade, mas também com o necessário ressugimento. A missão é formar parentescos em linhas de conexão inventivas como uma prática para aprender a viver e morrer bem uns com os outros em um presente espesso. Nossa tarefa é criar problemas, suscitar respostas potentes a eventos devastadores, e também acalmar águas turbulentas e recosntruir lugares tranquilos. Em tempos de urgências, é tentador abordar os problemas como quem procura assegurar o futuro imaginado, impedindo que algo que paira

PARADOXO DA MORAL

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No interior do mínimo ético, a consciência de si pode aparecer, em certos casos, como o elemento mais pesado da nossa bagagem, quando se acumula nela o estoque das nossas lembranças, das nossas tradições e dos nossos preconceitos. Porque a consciência de si é, como a própria liberdade, uma faca de dois gumes: ela é libertação reflexiva que põe fim à indivisão vegetativa; mas, na medida em que às vezes é introversão e retroversão, também é perversão e nos desvia da nossa vocação, que é agir e amar: nisso mesmo, ela pode se tornar pérfida e sutilmente falaciosa. JANKÉLÉVITCH, Vladimir. O paradoxo da moral. São Paulo: WMF Martisn Fontes, 2008, p. 221

Educação após Palestina

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  Relendo o texto Educação após Auschwitz de Theodor W. Adorno fiz, conscientemente, o trocadilho de "Auschwitz" por "Palestina". A começar pelo título: Educação após Palestina    A exigência que o genocídio que está ocorrendo na Palestina não se repita é a primeira de todas para a educação.     Me pergunto com sinceridade o que diria Adorno se estivesse vivo ante o acontecimento sem precedentes (outro acontecimento sem precedentes). Que diria ele sobretudo as seu povo, o povo israelita?    Em dado momento do texto, Adorno fala sobre a peça de Sartre Mortos sem sepulturas que causa horror a quem assiste; incomoda pois este é justamente o nosso mundo: dele [adorno] e nosso.    Theodor Adorno temia que Auscwitz se repetisse, lamento informá-lo, mas se repetiu e se repete em proporções menores - pequenas Auschwitzs ocorrem diariamente. 

ATÉ QUE A MORTE (NÃO) NOS SEPARE

  Até que a morte (não) nos separe Εριβαν Σιλβα* " Pois o amor é tão forte quanto a morte. .."  (Ct 8.6 KJA) Após o término da leitura de Carta a D. de André Gorz, tive a impressão de ter estado na sala do casal, André e Dorine, para uma conversa sobre amor. Mas não sobre qualquer amor, mas o amor deles . Um amor que sobreviveu 58 anos juntos, algo quase impossível de acontecer em nosso mundo líquido moderno. Após mais de meio século de vida a dois, Gorz escreve: "De novo, carrego no fundo do meu peito um vazio devorador que somente o calor do seu corpo contra o meu é capaz de preencher".  André Gorz não sabe explicar o por que amamos determinada pessoa "tive muitas dificuldades com o amor, pois é impossível explicar filosoficamente por que amamos determinada pessoa e queremos ser amados por ela, excluindo todas as outras". Essa impossibilidade de transferência do desejo pode ser vista na vida de Jacó, personagem bíblico. O desejo de Jacó por Raquel poder

LUTO POR PESSOAS FAMOSAS

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  Se o luto nos perturba por causa da perda da proximidade, por que então sentimos um luto tão intenso com a morte de um famoso que nunca encontramos pessoalmente? Esse tipo de luto é chamado de "luto parassocial". É muito real e vai além da evidência anedótica de pessoas que se sentiram desoladas pela morte de uma celebridade. As pessoas estão representadas na realidade virtual de nossos cérebros, e as celebridades pedem ter vidas muito reais em nossas mentes. A perda dessa celebridade não é apenas a perda de uma pessoa que ajudou a nos definir, mas também o luto por uma época de nossa vida à qual nunca mais podemos voltar. Esse luto é real porque sentimos a perda de um pedaço de nós mesmos. Referência O'CONNOR, Mary-Frances. O cérebro de luto: como a mente nos faz aprender com a dor e a perda. Rio de Janeiro: Principium, 2023.

Biopolítica e Black Mirror: uma relação entre Foucault e o episódio Engenharia Reversa da série Black Mirror

Εριβαν Σιλβα*  “ A função assassina do Estado só pode ser assegurada, desde que o Estado funcione no modo do biopoder, pelo racismo ”.  _______ Foucault    Resumo   A presente reflexão busca relacionar a lógica militar em Men against fire, quinto episódio da terceira temporada da série norte-americana Black Mirror, e relacionar com o conceito de biopolítica em Michel Foucault. Para tanto dividimos o texto em duas partes: a primeira analisa o episódio. Nesse primeiro momento analisamos as falas das personagens, onde, a nosso ver, fica claro uma relação intrínseca com o conceito de biopolítica ou biopoder, relação esta que veremos na segunda parte do texto. Introdução   1. Diálogos fundamentais de Men against fire para entender sua relação com a biopolítica A série norte-americana Black Mirror traz em sua terceira temporada o quinto episódio, Engenharia Reversa (men against fire). Neste episódio em questão, os militares são controlados por uma “máscara”; trata-se de um dispositivo im