FICAR COM O PROBLEMA - fazer parentes no Chthuluceno

 Trouble é uma palavra interessante. Ela deriva de um verbo francês do século XIII que significa agitar, instigar, enturvar, perturbar. Nós - todos os seres da Terra - vivemos em tempos perturbadores; tempos confusos, turvos e desconcertantes. Nossa tarefa consiste em nos tornarmos capazes de responder, conjuntamente e em todo nossa abundância espevitada de tipos.

Nossos tempos confusos transbordam de dor e alegria - com padrões vastamente injustos de dor e alegria, com matanças desnecessárias da continuidade, mas também com o necessário ressugimento.

A missão é formar parentescos em linhas de conexão inventivas como uma prática para aprender a viver e morrer bem uns com os outros em um presente espesso. Nossa tarefa é criar problemas, suscitar respostas potentes a eventos devastadores, e também acalmar águas turbulentas e recosntruir lugares tranquilos.

Em tempos de urgências, é tentador abordar os problemas como quem procura assegurar o futuro imaginado, impedindo que algo que paira no futuro aconteça, colocando o presente e o passado em ordem, a fim de criar futuros para as próximas gerações.

Ficar com o problema não requer esse tipo de relação com esses tempos que chamam de futuro.

Na realidade, ficar com o problema requer aprender a estar verdadeiramente presente; não como um eixo que se desvanece entre passados terríveis ou edênicos e entre futuros apocalípticos ou salvadores - mas como bichos mortais entrelaçados em uma miríade de configurações inacabadas de lugares, tempos, matérias, significados.

HARAWAY, Donna J. Ficar com o problema - fazer parentes no Chthuluceno. São Paulo: n-1 edições, 2023, p. 9.

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