quarta-feira, 17 de abril de 2013

Amor, morte e Bauman

"Põe-me como um selo sobre teu coração, como selo sobre o teu braço, porque o amor é forte como a morte..."
Cânticos dos cânticos 8.6


Zygmunt Bauman é um sociólogo polonês. Seus escritos formam uma vasta contribuição para o pensamento moderno, ou, pós-moderno, como o sociólogo descreve a época atual. Penso, que Bauman contribui também para o entendimento das relações afetivas. Qual um psicanalista, assim é seu livro AMOR LÍQUIDO. Dada a importância do trabalho, transcrevi e parafraseei parte de um texto:

Citando Ivan Klima, Bauman diz que "poucas coisas parecem tanto com a morte quanto o amor realizado". (...) Cada um deles nasce, ou renasce, no próprio momento em que surge, sempre a partir do nada, da escuridão do não ser sem passado nem futuro; começa sempre do começo, desnudando o caráter supérfluo das tramas passadas e a futilidade dos enredos futuros.

Tal como o rio de Heráclito, amor ou/e morte não podem ser penetrados duas vezes.

Amor e morte. Parentesco, afinidade, elos causais são traços da individualidade e/ou do convívio humanos. O amor e a morte não têm história própria. São eventos que ocorrem no tempo humano, eventos distintos, não conectados com eventos "similares", a não ser na visão de instituições ávidas por identificar (inventar) retrospectivamente essas conexões e compreender o incompreensível.

Assim, não se pode aprender a amar, tal como não se pode aprender a morrer. E não se pode aprender a arte ilusória (inexistente, embora ardentemente desejada) de evitar suas garras e ficar fora de sue caminho. Chegado o momento, o amor e a morte atacarão - mas não se tem a mínima ideia de quando isso acontecerá. Quando acontecer, vai pegar você desprevenido. (Sempre estaremos desprevenidos à morte/amor). Em nossas preocupações diárias, o amor e a morte aparecerão ab nihilo - a partir do nada. Evidentemente, todos nós tendemos a nos esforçar muito para extrair alguma experiência desse fato; tentamos estabelecer seus antecedentes, apresentar o princípio infalível de um post hoc como se fosse um propter hoc, construir uma linhagem que "faça sentido", e na maioria das vezes obtemos sucesso. Precisamos desse sucesso pelo conforto espiritual que ele nops trás: faz ressurgir, ainda que de forma circular, a fé na regularidade do mundo e na previsibilidade dos eventos, indispensáveis para a nossa saúde mental.

No caso da morte, o aprendizado se restringe de fato à experiência de outras pessoas, e portanto constitui uma ilusão in extremis. A experiência alheia não pode ser verdadeiramente aprendida como tal; não é possível distinguir, no produto final da descoberta do objeto, entre o Erlebnis original e a contribuição criativa trazida pela capacidade da imaginação do sujeito. A experiência dos outros só pode ser conhecida como história manipulada e interpretada daquilo que eles passaram. No mundo real, tal como nos desenhos de Tom & Jerry, talvez alguns gatos tenham sete vidas ou até mais, e talvez alguns convertidos possam acreditar na ressurreição - mas permanece o fato de que a morte, assim como o nascimento, só ocorre uma vez. Não há como aprender a "fazer certo na próxima oportunidade" com um evento que jamais voltaremos a vivenciar.


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