terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Nem apoteose nem apostasia: só desisto de viver

"No dia 11 de novembro de 1997, Veronika decidiu que havia - afinal! - chegado o momento de se matar. Limpou cuidadosamente seu quarto alugado num convento de freiras, desligou a calefação, escovou os dentes e se deitou." (VERONIKA DECIDE MORRER - PAULO COELHO)


"A vela arde até o fim numa noite. Sentei-me à mesa em silêncio, tirei o revólver e o coloquei à minha frente. Quando o coloquei, lembro, perguntei a mim mesmo: 'É assim?', e com absoluta determinação respondi a mim mesmo: 'É assim'. Ou seja, vou me matar. Sabia que em fim nessa noite certamente me mataria, mas até lá quanto tempo iria ficar sentado à mesa, isso não sabia. E é claro que teria me matado, se não fosse aquela menina."  (O SONHO DE UM HOMEM RIDÍCULO - DOSTOIÉVSKI)



Penso que a única coisa que se possa falar sobre o suicídio é que é a prova cabal de que existe coisas na vida piores do que a morte. André Comte-Sponville no seu livro Bom dia angústia, diz o seguinte:

"O suicida não morre mais do que os outros, e não mais cedo do que muitos. Morre de modo diferente, por certo, já que morre voluntariamente. Eis por que também, às vezes, morre melhor"

Nas Trioanas, Sêneca colocou a seguinte fala na boca de Pirro: "Muitas vezes um ser misericordioso concede a morte no lugar da vida." Nos servirá essas palavras de consolo? De modo nenhum. Não queremos perder. Não queremos enterrar parentes e amigos. Não há conformidade com a morte. No livro Boa noite a todos, somos apresentados a uma senhora chamada Maggie. Esta pretende se matar. Em seu devaneio, ela pensa: "Por quanto tempo ainda existirei na memória das pessoas?" Bem, eu respondo pela Maggie. Respondo pelos meus amigos e parentes que morreram. Sim. Vocês continuam existindo em nossa memória. Sim, ainda sonho com vocês e nos sonhos estão bem vivos. Rubem Alves, escrevendo sobre o suicídio disse:


Muitos amigos meus se suicidaram, pessoas que eu amava e admirava. Curioso: todos os suicidas que conheci eram pessoas inteligentes, sensíveis, íntegras, e nas suas vidas aparecia a beleza."


Hoje foi assim. Mais um amigo, colega de farda cometeu suicídio. A "má-nova" me deixou sem chão. Eu disse comigo:"não acredito!!!" Mas no fundo eu sabia que era real; outra perda estúpida. Sem respostas...


Os demônios moram no vazio e a partir de hoje um demônio chamado saudade me atormentará no vazio que você deixou. Philippe Gomes de Melo. O Sd Gomes. Um cara com quem eu adorava conversar sobre filosofia e músicas antigas. Lamento por você amigo. Sabe, quando o rei Davi perdeu seu amigo Jônatas (e Saul) na peleja, ele levantou um lamento em todo Israel. "Ah! Ornamento de Israel! Nos teus altos, fui ferido; como caíram os valentes!" São muitos valentes que perdemos. E isso dói. Eu olho para o cemitério e penso:
Quantos sábios e inteligentes;
quantos engraçados e divertidos;
quantos filhos, pais, mães, avós...
quanto amor depositado em caixões;
quantos amigos...

Eu gosto desse texto da Lya Luft:

"Apesar de todo dilaceramento,
solidão e lágrimas, a morte tem 
um poder limitado: seu dedo cruel
e ossudo não consegue encontrar
a tecla com que deletar nossos
melhores afetos"

Ou seja, a morte não leva a memória.


"Agora, agora ó sofrimento mostra tua força!"

Amigo entraste no reino do silêncio eterno...

Apenas descansa em paz.

   



DEPRESSÃO 

Fala-se muito em depressão. já ouvi o seguinte: depressão é como estar enterrado acima do solo, sepultado em seu próprio corpo. Sobre o tema, Andrew Solomon aborda em seu magnífico livro: O DEMÔNIO DO MEIO DIA, UMA ANATOMIA DA DEPRESSÃO.


"A depressão é a imperfeição no amor. Para poder amar, temos que ser capazes de nos desesperarmos ante as perdas, e a depressão é o mecanismo desse desespero. Quando ela chega, destrói o indivíduo e finalmente ofusca sua capacidade de dar ou receber afeição. Ela é a solidão dentro de nós que se torna manifesta e destrói não apenas a conexão com outros, mas também a capacidade de estar em paz consigo mesmo. Embora não previna contra a depressão, o amor é o que tranquiliza a mente e a protege de si mesma. (...) O amor nos abadona de tempos em tempos, e nós abandonamos o amor. Na depressão, a falta de significado de cada empreendimento e de cada emoção, a falta de significado da própria vida se tornam evidentes. O único sentimento que resta nesse estado despido de amor é a insignificância."

Andrew Solomon pede para que levemos em consideração que a depressão pode ser a maior assassina do mundo. penso que seja necessário resignificar nossa própria vida embora eu não saiba ao certo como fazer isso. Não há fórmulas mágicas para a vida e as percas são inevitáveis. Falando sobre o suicídio Solomon conclui:

"Nietzsche certa vez disse que a ideia do suicídio mantém muitos homens vivos na parte mais sombria da noite.  Eu diria que, quanto mais completamente alguém se conforma com a ideia do suicídio racional, mais protegido estará do suicídio irracional. Saber que se eu atravessar este minuto sempre poderei me matar no próximo torna possível atravessar este minuto sem ser totalmente destruído por ele. O suicídio pode ser um sintoma da depressão; é também um fator que a suaviza. A ideia do suicídio possibilita atravessar a depressão. Tenho esperança  de que viverei enquanto puder dar ou receber coisa melhor do que dor, mas não prometo que nunca me matarei. Nada me aterroriza mais do que a ideia de que eu poderia, em algum estágio, perder a capacidade de cometer suicídio." 












2 comentários:

  1. Sou irmã do soldado Gomes.
    Gratidão pelo seu carinho. Me salta o coração de saudade e orgulho dele.

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  2. Olá Evelyn
    Lamento muito pelo seu irmão.
    Forte abraço

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